Sermão para o Segundo Domingo da Quaresma
24 de fevereiro de 2013 - Padre Daniel Pinheiro
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
“Que cada um de vós saiba possuir o seu corpo em santidade e honra.”
Nós, seres humanos, somos formados por
corpo e alma. Estamos colocados entre os anjos, que são puro espírito e
os seres puramente materiais. No homem, a alma e o corpo estão unidos,
formando a própria essência dele. Evidentemente, essa união natural
entre a alma e o corpo, querida por Deus, é algo bom. A alma precisa do
corpo para realizar suas operações de maneira mais conveniente. A alma,
para conhecer as coisas, precisa dos sentidos, da imaginação. São Tomás
diz que nada está no nosso intelecto, a não ser que tenha passado antes
pelos sentidos. Todo o nosso conhecimento vem pelos sentidos. O corpo é,
portanto, um bem para a nossa alma, um bem para o ser humano. A alma
separada age de modo menos perfeito do que quando se encontra unida ao
corpo e, por isso, ela deseja a ressurreição do corpo, após a morte.
Todavia, é claro que a parte mais nobre
do composto humano é a alma, parte espiritual, e que pode conhecer a
verdade e amar o bem. É pela parte espiritual ou racional, quer dizer,
pela inteligência e pela vontade, que nos distinguimos dos animais
brutos. E no homem, como em todas as coisas, o inferior deve estar
subordinado ao superior. Portanto, é a razão que deve dirigir as ações
do nosso corpo, é a razão que, reconhecendo a nossa natureza e
reconhecendo a natureza e a finalidade das nossas faculdades, deve
ordenar todas as nossas ações. A ordenação dos nossos atos segundo a
razão constitui a virtude. A virtude é, então, a ordenação dos nossos
atos, de forma que eles sejam conformes à nossa natureza de animais
racionais.
Entre esses atos que devem ser ordenados
pela razão estão os atos exteriores: as palavras, os gestos e também o
vestir. A razão nos mostra com relação ao vestir que ele tem uma
finalidade básica e principal, que nos é dada pela própria Revelação.
Essa finalidade é a decência.
Quando Deus criou Adão e Eva, os dois
estavam em estado de graça e haviam recebido da bondade divina o dom da
integridade. Isso significa que todas as suas paixões estavam plenamente
subordinadas à razão. Não havia em Adão e Eva nenhuma desordem no campo
da concupiscência e, por isso, não precisavam se vestir. A exposição do
corpo entre eles, portanto, não era motivo para nenhum pensamento,
desejo ou ato desordenado. Assim, a Sagrada Escritura diz que eles não
se envergonhavam.
Todavia, nossos pais cometeram o pecado
original, que foi um pecado de orgulho – que não teve nenhuma relação
com o sexto mandamento, deixo claro. Ao cometerem o pecado original, a
razão e a inteligência se revoltaram contra Deus e a faculdades
inferiores e as paixões, que se encontravam plenamente submissas à
razão, revoltaram-se contra ela. A Sagrada Escritura nos mostra
claramente isso com relação ao corpo: os olhos de ambos se abriram e
tendo conhecido que estavam nus, coseram folhas de figueira e fizeram
para si cinturas. Todavia, essas poucas folhas de figueira não eram
suficientes para evitar a desordem e Deus fez, Ele mesmo, umas túnicas
de pele e os vestiu.
Então, caros católicos, o corpo é em si
mesmo bom e é a obra material mais perfeita que saiu das mãos do
criador. A Igreja Católica reconhece a excelência do corpo e é a maior
defensora da honra e da dignidade do corpo, pois ela reconhece o devido
lugar do corpo, subordinado à alma. A Igreja reconhece a excelência do
corpo ao ponto de não favorecer a cremação do corpo. Quem odeia o corpo
são aqueles que não reconhecem o seu devido lugar, subordinado à alma.
Quem odeia o corpo são aqueles que o colocam acima da razão e submetem a
razão às paixões e usam o corpo de forma indevida. Ao longo da
história, vemos que os que mais permitem desordens com o corpo são os
que o odeiam. Assim foi com os gnósticos e os cátaros, por exemplo.
Essas heresias consideravam o corpo como intrinsecamente mau e,
portanto, o entregavam a todo tipo de desordem, com a condição de que se
impedisse a geração de uma nova vida, de um novo corpo.
Hoje, é exatamente o que vemos em nossa
sociedade. Ela exalta tanto o corpo porque o odeia. Ela não reconhece o
lugar do corpo. Ela permite tudo ao corpo e todas as desordens, desde
que uma nova vida não seja gerada. As pessoas passam a vida inteira
submetendo-se ao corpo para, no final, queimá-lo, cremando-o, com esse
costume pagão que tem cada vez mais força entre nós. A Igreja respeita o
corpo durante a vida da pessoa e reconhecendo a sua dignidade não vê
com olhos favoráveis a cremação. Portanto, caros católicos, se alguém
reconhece a bondade e a dignidade do corpo é a Igreja, que chega a
proclamá-lo Templo do Espírito Santo, pois nossa alma, em que pode
habitar o Espírito Santo, está unida ao corpo intimamente.
Depois do pecado original, apesar de
nosso corpo ser em si bom, devemos nos vestir, devemos esconder algumas
partes do nosso corpo, a fim de não provocar nos outros maus
pensamentos, maus desejos, maus atos em virtude das paixões
desordenadas. Depois do pecado original, o pudor e a modéstia são
indispensáveis. O pudor consiste na vergonha salutar no que toca ao
sexto mandamento e que leva as pessoas a cobrirem as partes de seu corpo
que podem levar outras pessoas a caírem na impureza. Foi o que Deus fez
com Adão e Eva, cobrindo-os com túnicas. A modéstia é a virtude que nos
leva a ordenar nosso aparato exterior, em particular as vestes, a fim
de que elas cumpram bem a finalidade delas: esconder certas partes do
corpo. A primeira dessas finalidades é a decência. Para que uma veste
seja chamada decente, ela deve cobrir aquelas partes do corpo que
induzem o homem de virtude média ao pecado. Essas partes que devem ser
absolutamente cobertas são aquelas que se encontram entre os joelhos e
os ombros, incluindo os dois. Portanto, a roupa deve cobrir o joelho em
todas as posições, inclusive quando se está sentado com as pernas
cruzadas. As roupas devem ter mangas também e não basta cobrir os ombros
com o véu quando se vem comungar.
O Cardeal Vigário de Roma na época do
Papa Pio XI diz que “um vestido não pode ser chamado de decente se é
cortado mais que a largura de dois dedos sob a cova da garganta, se não
cobre os braços pelo menos até os cotovelos, e se mal chega até um pouco
abaixo dos joelhos. Além disso, os vestidos de materiais transparentes
são impróprios…” A única coisa que se permite alterar aqui, e que é
admitido por todos os sacerdotes de doutrina moral séria, são as mangas
até os cotovelos, mas não se pode admitir a ausência completa de mangas.
E para que vestir-se de modo diferente do
que diz o Cardeal Vigário? Para que mostrar o nosso corpo? Para que
atrair os olhares dos outros sobre nosso corpo? Isso só é lícito entre
marido e mulher, em vista da procriação. Para que se mostrar para os
outros? O que se ganha a expor o corpo aos outros? Isso lhe fará ganhar o
céu? Ao contrário. Para que ser ocasião de pecado para os outros? E não
adianta dizer que, se o outro tem pensamentos ruins, a culpa é dele.
Não. Nós somos responsáveis pela salvação das almas dos nossos irmãos.
Ai daquele que é causa de escândalos, nos diz Nosso Senhor Jesus Cristo.
Tudo isso aqui se aplica sobremaneira à
mulher, pois a mulher tem uma inclinação natural a buscar agradar o
homem pelo seu aspecto físico e o homem tem uma inclinação natural a
deixar-se levar por isso. Vemos isso claramente no livro do Gênesis, em
que Eva é apresentada a Adão, que encontra nela agrado. Se essa
inclinação permanece sóbria e moderada, dentro da modéstia, ela é algo
bom. Se ela se torna excessiva pela indecência, pelo excesso de ornato
ou pelo luxo no ornato, ela se torna ruim. Desse modo, a modéstia não é
sinônimo de deselegância. A modéstia não se opõe à elegância. A
elegância é perfeitamente bem-vinda, desde que seja modesta e sem
excessos, sem atrair para si os olhares.
Alguns pretendem dizer que a moda
indecente já é tão comum que ela não provoca mais as paixões
desordenadas. Isso é falso. A partir de certo ponto, dizem os
moralistas, as vestes indecentes sempre trarão prejuízo para o pudor,
para a pureza. Esse limite é justamente os ombros e os joelhos, que
devem estar sempre cobertos. E ainda que as modas indecentes não
conduzissem ao pecado contra o sexto mandamento, o cristão não deve se
contentar com os padrões de uma sociedade decadente, corrompida e
neo-pagã. Os jesuítas não se contentaram com a ausência de vestes dos
índios, embora os índios estivessem habituados a isso. Eles mudaram a
maneira de vestir dos indígenas.
Em virtude da união que existe entre a
alma e o corpo que falamos mais acima, as vestes têm duas funções
importantes. Primeiramente, a veste é reflexo da alma da pessoa.
Portanto, se vestir mal reflete uma desordem espiritual, interior. Por
outro lado, nossas ações exteriores e, consequentemente, nossas vestes
têm uma influência em nossa alma. Assim, por exemplo, rezar de joelho ou
rezar de pé criam disposições distintas em nossa alma. Roupas
indecentes geram na alma consequências prejudiciais com relação à pureza
e levará a um jeito de se comportar indecente: a um jeito de andar, de
sentar, de falar que não convém. Por outro lado, roupas modestas levam a
alma a se resguardar melhor contra os pecados opostos ao sexto
mandamento. As roupas decentes criam na alma uma disposição que leva a
pessoa a andar, a sentar, a falar de um modo que convém para cristãos.
Na segunda-feira de Carnaval falamos aqui
da luxúria e de suas consequências graves para a sociedade. Em
particular, vimos que a luxúria conduz ao amor de si mesmo, ao ódio a
Deus. Vimos que a luxúria conduz ao apego à vida presente e ao desespero
das coisas do alto. Vimos que a luxúria mata não só a alma daquele que a
comete, mas destrói também a sociedade, como falamos na ocasião. Como
chegamos nessa sociedade em que tudo, praticamente, se move pela
luxúria? Uma das principais causas é a falta de modéstia no vestir. A
modéstia é a guardiã da castidade. Sem a modéstia não há castidade. Sem
castidade, não há amor a Deus. Por mais que a intenção da pessoa não
seja ser objeto do olhar das outras pessoas, ela será e será ocasião de
pecado, se ela se veste indecentemente. Uma boa intenção não é
suficiente para tornar uma ação ruim, boa. Assim, vestir-se
imodestamente por que está calor, por exemplo, não se justifica.
Portanto, caros católicos, é preciso usar
vestes modestas. Espero que todos tenham entendido e comecem agora a
seguir plenamente esses ditames. Se não compreenderam, passem a seguir
por obediência ao sacerdote. A obediência também é uma virtude
excelente. E, para deixar claro, as regras de modéstia não se resumem à
Igreja. Essas regras de modéstia devem ser observadas sempre e em todo
lugar. Repitamos: As vestes devem cobrir tudo o que está entre os
joelhos e os ombros, incluindo joelhos e ombros, e em qualquer posição
(de pé, sentado, ajoelhado). As vestes devem, portanto, possuir mangas e devem ser sem decotes. 2) As vestes não devem ser transparentes nem em tom de pele e 3) não devem ser apertadas ou coladas ao corpo. Será
necessário um grande esforço, um grande desapego. Mas ele é necessário.
E Deus nos dá as graças para fazê-lo. E será grande a recompensa de
quem praticar a virtude do pudor e da modéstia, tão esquecidas, mas tão
essenciais para uma vida católica. Aproveitemos o tempo da quaresma. Ele
é muito propício aos esforços. Deus saberá recompensar esse ato de
caridade da pessoa para consigo mesma e para com o próximo.
A modéstia é também vestir-se em
conformidade com o próprio estado, com as circunstâncias, com o grau de
formalidade do lugar, da atividade e levando em conta a dignidade da
pessoa com quem se está. Assim um sacerdote que aparece em público sem a
batina ou o hábito clerical – contrariando, aliás, o Direito Canônico –
comete uma falta contra a modéstia, pois não se veste conforme ao seu
estado. Em geral, como católicos, devemos nos vestir conforme ao nosso
estado de católicos. Portanto, como pessoas que levam a vida à sério,
buscando agradar a Deus.
Evitem-se, então, as roupas desleixadas,
com símbolos pagãos, com inscrições contrárias à religião, etc.
Sobretudo na Igreja é indispensável observar a modéstia também nesse
ponto. A roupa deve ser adequada àquilo que há de mais importante na
face da Terra: a Casa de Deus, sobretudo quando nela se realiza o Santo
Sacrifício da Missa. A pessoa deve, então, vestir-se com dignidade para ir à Missa, evitando vestes demasiado informais. Particularmente, sejam abolidas as vestes que contenham desenhos (de animais, de pessoas etc) ou alguma mensagem escrita, mesmo para as crianças. Também não
sejam usadas roupas com personagens de desenho, com frases escritas,
camisetas de times de futebol, calças rasgadas, bermudas, moleton, etc.
Nada disso condiz com a santidade e a dignidade do lugar. Não se deve,
porém, cair no erro oposto. Dignidade com simplicidade e sem exageros.
É próprio da virtude da modéstia também
que homens e mulheres se vistam de forma a diferenciar o sexo de cada um
e de forma a exprimir o papel de cada um na sociedade. As vestes
semelhantes de homens e mulheres causam muitos danos às próprias pessoas
e à sociedade. Como disse, as vestes exprimem uma disposição da alma e
terminam também influenciando o nosso comportamento. Se homens e
mulheres se vestem igualmente, haverá um grande problema. E esse
problema nós vivemos hoje. Os homens são cada vez mais efeminados. As
mulheres cada vez mais masculinizadas. O homossexualismo se difunde.
Portanto, é preciso haver diferença na maneira de vestir do homem e da
mulher e que essa maneira seja clara e modesta. E isso não só na
Igreja, mas em todos os lugares.
As veste imodestas ofendem ao Sagrado Coração de Jesus e por isso dizemos no Ato de Desagravo ao Sagrado Coração: “queremos
nós hoje desagravar-vos, particularmente da licença dos costumes
e imodéstias do vestido, de tantos laços de corrupção armados à
inocência [...].” Nossa Senhora de Fátima também insiste
na Modéstia, ao ponto de a letra da música de Nossa Senhora de Fátima
nos lembrar disso. Diz a letra: “Vesti com modéstia, com muito pudor, olhai como veste a Mãe do Senhor!” Eis o nosso modelo para a modéstia no vestir: Nossa Senhora, para as mulheres, e São José, para os homens.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
Fonte: Missa Tridentina em Brasilia
Castíssimo São José, rogai por nós!
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