Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.
O Santo Evangelho desse primeiro domingo
da Quaresma nos traz o exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele jejuou
40 dias no deserto. Esse jejum de Cristo é importante para nós. Esse
jejum de 40 dias, sem comer nada, de Nosso Salvador mostra,
primeiramente, a sua divindade. Ninguém consegue passar 40 dias sem
comer. Por outro lado, a fome de Cristo ao final dos 40 dias nos mostra a
sua humanidade. Cristo é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem,
nos diz constantemente o Evangelho. E por que Nosso Senhor jejuou? Para
reparar pelos seus pecados? Não, Ele não os tinha nem podia ter. Para
assegurar o domínio de sua razão e vontade sobre as paixões
desordenadas? Não, Nosso Senhor não tinha paixão desordenada: todos os
seus sentimentos e emoções estavam perfeitamente subordinados à sua
razão e à sua vontade, e estas completamente submissas à vontade de
Deus. Para que, então, Nosso Senhor jejuou durante 40 dias? Ele jejuou
para nos dar o exemplo e mostrar a importância dessa prática.
Convém compreender melhor a importância
do jejum. O jejum, prezados católicos, é ato da virtude da abstinência. O
que é uma virtude? Uma virtude nada mais é do que uma disposição bem
enraizada nas faculdades da nossa alma que nos inclina a agir em
conformidade com a reta razão iluminada pela fé. A virtude da
abstinência é, então, a virtude que nos inclina a usar moderadamente dos
alimentos corporais em conformidade com os preceitos da reta razão
iluminada pela fé. Estamos falando da virtude de abstinência, a não ser
confundida com a abstinência de carne, que prescreve a Igreja em todas
as sextas-feiras do ano e na quarta-feira de cinzas. A virtude da
abstinência nos inclina, então, a usar moderadamente dos alimentos, de
acordo com a reta razão iluminada pela fé. O jejum nada mais é do que um
ato da virtude da abstinência. O jejum é uma forma de praticar a
virtude da abstinência.
É muito comum se pensar que o jejum é uma
prática de devoção suplementar, que, na verdade, o jejum está longe de
ser necessário, etc. Na verdade, o jejum é uma prática necessária para
quem quer alcançar a perfeição. NS nos dá o exemplo no Evangelho de hoje
(Mt 4,2), Ele diz que certos demônios só podem ser expulsos com jejum e
oração (Mt 17, 21). Ele anunciou que seus discípulos praticariam o
jejum (Mt 9, 15), como efetivamente se fez desde os tempos apostólicos.
Os Santos Padres escreveram, por vezes, livros inteiros recomendando o
jejum. Santo Agostinho diz que o jejum “purifica a alma, eleva o
espírito, sujeita a carne ao espírito, dá ao coração contrição e
humildade, dissipa as trevas da concupiscência, extingue os ardores do
prazer e acende a luz da castidade.”
O Prefácio do Tempo da Quaresma diz algo
semelhante, de maneira resumida. Diz O Prefácio que o jejum corporal
reprime os vícios, eleva a mente, se concede a virtude e o prêmio da
virtude. São Tomás acrescenta que o jejum satisfaz pelos pecados. Assim,
prezados católicos, temos no jejum algo que diz respeito ao passado,
pois satisfaz por nossos pecados passados, e algo que diz respeito ao
presente, pois ele reprime os vícios, favorece a virtude e eleva a nossa
mente.
Pelo jejum, prezados católicos, comemos
menos do que nos seria necessário. Nossa razão compreende facilmente que
se faça um jejum de vez em quando em virtude de uma doença corporal ou
para evitar uma doença. Muito mais facilmente se compreende, então, que
se faça jejum para evitar males espirituais e para alcançar bens
espirituais.
Vejamos como o jejum reprime os vícios,
favorece a virtude, eleva a mente e satisfaz pelo pecado.
Primeiramente,
o jejum satisfaz pelo pecado porque ele é uma obra de penitência, ele é
uma pena que nos infligimos, tendo assim um caráter de reparação pela
satisfação ilícita alcançada em qualquer pecado. Em segundo lugar, o
jejum reprime os vícios. O que é um vício? O vício nada mais é do que
agir em desacordo com a reta razão. Um dos principais fatores que nos
leva a agir de modo contrário à reta razão são as paixões desordenadas,
que buscam um bem sensível independentemente da verdadeira bondade desse
bem ou não. O jejum assegura justamente que essas paixões não serão
satisfeitas e que elas se submeterão à razão e à vontade iluminadas pela
fé. Portanto, o jejum reprime os vícios ao tirar o império das paixões
sobre a razão e a vontade. Não se trata de suprimir as paixões, mas de
não consentir nas paixões desordenadas e de orientar as paixões, isto é,
nossas emoções e sentimentos em conformidade com a razão iluminada pela
fé. O jejum ajuda muitíssimo a restabelecer a devida ordem na nossa
alma. Em terceiro lugar, ao restabelecer a devida ordem em nossa alma,
reprimindo o vício, o jejum favorece necessariamente a virtude, que nada
mais é do que a disposição para agir em conformidade com a reta razão
iluminada pela fé. Com o jejum bem praticado, nossas paixões se
submeterão à nossa razão, e a nossa razão se submeterá a Deus. Em quarto
lugar, o jejum eleva a mente. Isso é claro. Menos apegado às coisas
sensíveis, não sofrendo mais a tirania das paixões, nossa inteligência
poderá se elevar às coisas celestes, poderá considerá-las com
tranquilidade e, consequentemente, amá-las mais profundamente. Isso
ocorre, prezados católicos, porque nossa alma é una. Dessa forma, quando
ela se aplica com veemência a uma coisa não pode se aplicar a outra
coisa com profundidade. O jejum diminui a aplicação da nossa alma das
coisas materiais, permitindo que nos elevemos às espirituais. Assim, ao
nos fazer reparar pelo pecado, ao reprimir os vícios, ao favorecer as
virtudes, ao elevar a nossa mente para as coisas do alto, o jejum nos
ajudará muitíssimo a alcançar o prêmio da vida eterna. O jejum, como
podemos constatar, caros católicos, é de suma importância. Mesmo se não
houvesse religião, nossa razão compreenderia a importância do jejum para
poder viver de modo ordenado. O jejum é um preceito da lei natural tão
importante que Deus quis também nos instruir a respeito dele e mostrar a
importância dele na sua Revelação, como, por exemplo, nos quarenta dias
em que Cristo jejuou.
Portanto, o jejum é necessário.
Atualmente, a disciplina da Igreja ordena somente dois dias de jejum: na
quarta-feira de cinzas e na sexta-feira santa, para os fiéis entre 18 e
60 anos. Esses dois dias no ano são insuficientes, para que
desenvolvamos a virtude da moderação nos alimentos. Há 60 anos, o jejum
se fazia durante a quaresma em vários dias da semana, em 3 ou 4 dias,
por exemplo. Além disso, havia as Vigílias das grandes festas, que
também eram dia de jejum. E, finalmente, havia quatro vezes ao ano,
correspondendo aproximadamente às estações do ano, as chamadas quatro
têmporas, que eram três dias de jejum. Eram, então, mais doze dias de
jejum no ano. E os dias eram bem escolhidos. A Quaresma como preparação
para a Páscoa. As vigílias em preparação para a festa de grandes
mistérios e as quatro têmporas eram o período em que se faziam as
ordenações. O jejum permitia, então, a reparação pelos pecados, a
repressão do vício, a elevação da mente, para considerar a grandeza da
páscoa, dos outros mistérios e para que fossem ordenados dignos
pastores. Com a antiga disciplina, seguindo simplesmente o que mandava a
Igreja, era possível adquirir a virtude que nos modera nos alimentos.
Atualmente, embora a lei da Igreja seja em si boa, pois comanda o jejum,
não é suficiente para desenvolver em nós a virtude. Precisamos,
portanto, caros católicos, ir além daquilo que pede a disciplina atual
da Igreja.
Todavia, para praticar bem o jejum é
preciso praticá-lo com prudência. Não é bom o jejum que prejudica a
saúde. Não é bom o jejum que nos impede de cumprir os nossos deveres de
estado. Assim, não precisam jejuar a mulher grávida, ou alguém que tenha
um problema de saúde que pode ser agravado pelo jejum, ou o que tem um
trabalho árduo. Não é bom o jejum que se transforma em um fim em si
mesmo. Não, o fim do jejum é a união com Deus, a virtude, a perfeição, a
caridade. Não é bom o jejum feito por orgulho. O jejum deve ser humilde
e feito com muita simplicidade e por amor a Deus. Não é bom o jejum que
nos deixa irritados e que nos faz descontar essa irritação nos outros. O
bom jejum deve aumentar a nossa caridade fraterna. Enfim, o jejum deve
ser prudente e ordenado realmente a Deus.
Lembramos que o jejum é comer uma
refeição normal no dia e fazer duas colações que, juntas, não chegam a
uma refeição normal. Diante da importância do jejum, caros católicos,
procuremos praticá-lo ao menos uma ou duas vezes por semana durante a
quaresma e escolhamos alguns dias para praticá-lo durante o ano.
O jejum bem praticado reprime os vícios,
eleva a mente, dá a virtude, satisfaz pelo pecado e nos faz merecer o
prêmio da vida eterna porque nos conduzirá a praticar o amor a Deus e o
amor ao próximo por amor a Deus. Eis, então, prezados católicos, a
importância desse ato de virtude que é o jejum, tão recomendado pela
Sagrada Escritura, tão recomendado por Nosso Senhor, tão recomendado
pelos apóstolos, pela Igreja e pelos Santos.
Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.Fonte: Missa Tridentina em Brasilia
Glorioso São José, rogai por nós!
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